Analisando a distopia do mundo Cyberpunk

Definição do termo

Tentar definir o termo “Cyberpunk” é uma tarefa difícil, pois este se refere tanto a uma cultura quanto a um gênero. No que se diz a cultura ele é anti-autoritário, avesso à marca, alfabetizado por tecnologia, dentre outras caracteristicas.

Como subgênero alternativo de ficção científica, é conhecido por seu enfoque de “alta tecnologia e baixa qualidade de vida” (“High tech, Low life”). Este descreve o lado niilista e underground da sociedade digital mesclada com o mundo real, que se desenvolveu a partir nas últimas duas décadas do século XX.

O termo foi utilizado pela primeira vez em 1983 por Bruce Bethke, escritor norte-americano, mas rapidamente foi acolhido aos trabalhos de outros escritores como: William Gibson, Bruce Sterling, John Shirley, Rudy Rucker, Michael Swanwick, Pat Cadigan, Lewis Shiner, Richard Kadrey dentre outros.

O argumento da dessa ficção geralmente tem como base um conflito que envolve hackers que contrariam os padrões impostos pela sociedade, inteligências artificiais e megacorporações, num futuro próximo. Portanto o cyberpunk pode ser entendido como uma inquietude e um chamado à ação.

A partir de vários estudiosos no assunto, o gênero Cyberpunk passou a ser uma visão de mundo, uma forma de vivenciar o conflito da realidade potencializada através do que era percebido apenas na literatura. O ver ou despertar além do corpo e da mente, a tecnologia idealizada a tempos, sendo implantada à realidade, a obtenção da informação livre para todos, o uso de tecnologias do ciberespaço. Assim muitas vezes é usada como uma metáfora para as preocupações atuais sobre os efeitos negativos do capitalismo, corrupção nos governos, alienação e vigilância por meio da tecnologia e controle das grandes corporações sobre as pessoas.Embora as histórias de ficção científica sejam contadas, há muito mais do que uma engenhosa descrição do futuro.

O manifesto Cybepunk

Publicado em 1997 por Christian As. Kirtchev. O texto retrata seu pensamento e de uma geração que viveu a ascensão tecnológica e cultural daquela época. O texto aborda questões políticas, sociais e tecnológicas.

Antes da leitura, vale lembrar que o intuito desse post é o estudo deste subgênero alternativo da ficção científica que subsequente gerou visões filosóficas de de mundo. O conceito de “manifesto” por definição é considerado uma importante ferramenta democrática, pois possibilita que todo o indivíduo possa expressar publicamente o seu ponto de vista sobre determinado situação ou assunto, seja social, político, cultural ou religioso.

I. Cyberpunk

  • Nós somos aqueles, os Diferentes. Estranhos. Ratos tecnológicos, nadando no oceano de informações
  • Nós somos as crianças introvertidas da escola, sentadas na última carteira no canto da sala de aula.
  • Nós somos os adolescentes que todos os colegas consideram estranhos.
  • Nós somos os alunos que hackeavam os sistemas de computador, explorando a profundidade de seu alcance.
  • Nós somos os adultos no parque sentados em um banco, laptop sobre os joelhos, programando a mais recente realidade virtual.
  • A nossa é a garagem cheia de eletrônicos. O ferro de soldar no canto de uma mesa mais próxima. Os rádios desmontados, eles também são nossos. O nosso porão tem computadores, impressoras barulhentas e modems com sinais sonoros.
  • Nós somos aqueles que veem a realidade de forma diferente. Nosso ponto de vista vê além do que as pessoas comuns podem perceber. Eles veem o que está fora, mas nós vemos o que está dentro. Isso é o que somos, realistas com óculos de sonhadores.
  • Nós somos aquelas pessoas estranhas, quase desconhecidas na vizinhança. As pessoas entretidas em seus próprios pensamentos, sentando-se dia após dia diante do computador, vasculhando a rede em busca de alguma coisa. Não costumamos estar longe de casa. De vez em quando saímos e apenas para ir à loja de eletrônicos, ao bar (de costume para encontrar alguns de nossos poucos amigos), para encontrar um cliente, farmacêutico clandestino, ou apenas para uma pequena caminhada.
  • Não temos muitos amigos, apenas alguns com quem vamos a festas. Todos os outros que conhecemos, conhecemos na rede. Nossos verdadeiros amigos estão lá, do outro lado da linha. Nós os conhecemos de nosso canal IRC favorito (Antigo mensageiro instantâneo), dos grupos de notícias ou dos sistemas que temos.
  • Somos aqueles que não ligam para o que as pessoas pensam de nós. Não nos importamos com o que parecemos aos olhos dos outros, ou o que as pessoas dizem nas nossas costas.
  • A maioria de nós gosta de viver escondido, desconhecido de todos, exceto daqueles poucos com os quais devemos inevitavelmente ter contato.
  • Alguns adoram publicidade, outros amam a fama. Mas eles são apenas conhecidos no mundo underground. Seus nomes são frequentemente ouvidos lá. Mas estamos todos unidos por uma coisa: Nós somos Cyberpunks.
  • A sociedade não nos entende. Somos “esquisitos” ou “loucos” aos olhos das pessoas comuns que vivem longe da informação pura e das ideias livres. A sociedade nega nossa maneira de pensar. Uma sociedade que vive, pensa e respira de uma e apenas uma maneira, da maneira clichê.
  • Eles nos negam porque pensamos como pessoas livres, e o pensamento livre é proibido.
  • O Cyberpunk não tem uma aparência externa única. Cyberpunks são pessoas, começando do comum e desconhecido por ninguém, ao artístico tecnomaníaco, ao músico com inclinações eletrônicas, ao cientista de mente aberta.
  • Cyberpunk não é mais simplesmente um gênero literário, nem mesmo uma subcultura comum. Cyberpunk é uma nova cultura autônoma. A prole da nova era. Uma cultura que une nossos interesses e visões comuns. Somos uma unidade. Somos Cyberpunks.

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II. Sociedade

  • A Sociedade que nos rodeia está entupida de conservadorismo, puxando tudo e todos para si, enquanto afunda lentamente na areia movediça do tempo.
  • Por mais obstinadamente que alguns se recusem a acreditar, obviamente vivemos em uma sociedade doente. As chamadas “reformas” que nossos governos tão habilmente usam para se vangloriar nada mais são do que pequenos passos, enquanto os grande avanços são possíveis são ignorados.
  • As pessoas temem o novo e o desconhecido. Eles preferem as verdades antigas, conhecidas e comprovadas. Eles têm medo das novas possibilidades que podem trazer. Eles têm medo de perder o que possuem.
  • Esse medo é tão intenso que proclamam o revolucionário um inimigo e a livre ideia sua arma. Isso é culpa deles, eles dizem.
  • As pessoas devem deixar esse medo para trás e seguir em frente. Qual é o ponto de se agarrar ao pouco que você tem agora, quando você pode ter mais amanhã? Eles devem estender as mãos e abraçar o novo: dar liberdade aos pensamentos, ideias e palavras.
  • Durante séculos, cada geração foi educada no mesmo padrão, ensinou a ideologia que todos seguem cegamente. A individualidade é esquecida. As pessoas pensam da mesma forma, seguindo os clichês ensinados a elas quando crianças: e quando alguém ousa desafiar a autoridade, ele é punido e considerado um mau exemplo: “Aqui está o que acontece com você quando você se expressa e nega a opinião de seu professor. ”
  • Nossa sociedade está doente e precisa de cura. A cura é uma mudança no sistema.

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“O futuro já está aqui, ele só não é muito bem distribuído.” – William Gibson

III. O sistema

  • Com séculos de existência, o sistema existe sobre princípios ultrapassados, sistema que mudou pouco desde a sua concepção.
  • O sistema está errado.
  • O sistema deve impor sua verdade sobre nós para que possa governar. O governo precisa que o sigamos cegamente. Por isso, vivemos um eclipse informacional. Quando as pessoas só podem obter informações do governo, elas não conseguem distinguir o certo do errado. Assim, a mentira se torna uma verdade. Verdade, fundamental para tudo o mais. Assim, os líderes controlam com mentiras e as pessoas comuns não têm noção do que é verdade e seguem o governo cegamente, confiando nele.
  • Lutamos pela liberdade de informação. Lutamos pela liberdade de expressão e imprensa. Lutamos pela liberdade de expressar nossos pensamentos livremente, sem ser perseguidos pelo Sistema.
  • Mesmo nos países mais desenvolvidos e “democráticos”, o sistema nos impõe desinformação. Mesmo nos países que pretendem ser o berço da liberdade de expressão, a desinformação é a principal arma do sistema. Uma arma que eles usam muito bem.
  • É a internet que nos ajuda a divulgar informações livremente. A net, sem fronteiras ou limite de informações.
  • O que é nosso é seu, o que é seu é nosso.
  • Todos podem compartilhar informações sem restrições.
  • A criptografia de informações é nossa arma. Assim, as palavras da revolução podem se espalhar sem interrupções e o governo permanece no escuro.
  • A internet é nosso reino. Na net, somos reis.
  • O mundo está mudando, mesmo que lentamente, mas as leis continuam as mesmas. O sistema não está mudando. Durante séculos, as leis permaneceram as mesmas. Poucos detalhes são ajustados aos tempos modernos, mas conceitualmente tudo permanece o mesmo.
  • Precisamos de novas leis. Leis que se ajustam aos tempos em que vivemos, que se ajustam ao mundo que nos rodeia. Não são leis construídas com base no passado. Leis construídas para hoje, leis que se ajustam amanhã.
  • Essas leis apenas nos limitam. Essas leis precisam de revisão, muito.

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IV. A visão

  • Algumas pessoas não se importam com eventos globais. Eles se preocupam apenas com o que acontece ao seu redor em seu micro-universo.
  • Essas pessoas só podem ver um futuro sombrio, pois só podem ver a vida que vivem agora neste mundo confuso.
  • Alguns mostram preocupação com os assuntos globais. Interessados em tudo: no futuro, na perspectiva e no que vai acontecer globalmente.
  • Eles têm uma visão mais otimista. Para eles, o futuro é mais limpo e bonito, uma utopia. Eles olham para o futuro e veem um homem mais maduro, um mundo mais sábio.
  • Estamos no meio. Estamos interessados ​​no que acontece agora, mas também no que vai acontecer amanhã.
  • Nós olhamos para a Internet, e ela está ficando cada vez mais expansiva.
  • Em breve, tudo neste mundo será engolido pela Internet, de sistemas militares a computadores domésticos.
  • Mas a net é uma casa de anarquia, sem controle.
  • A rede não pode ser controlada e é nisso que reside o seu poder.
  • Todo homem será dependente da internet.
  • Todas as informações da humanidade estarão lá, presas no abismo de “uns” e “zeros”.
  • Aqueles que controlam a internet, controlam a informação.
  • Vivemos em uma mistura de passado e presente.
  • O mal vem do homem e o bom vem da tecnologia.
  • A rede controlará o homem e nós controlaremos a rede.
  • O que você não controla, irá controlar você.
  • Informação é poder!

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V. Onde estamos?

  • Todos nós vivemos em um mundo doente onde o ódio é uma arma e a liberdade é um sonho
  • O mundo se desenvolve tão lentamente. É difícil para um Cyberpunk viver em um mundo subdesenvolvido, observando as pessoas ao seu redor e vendo como elas se desenvolvem erroneamente
  • Seguimos em frente; eles nos puxam de volta. A sociedade nos suprime. Sim, suprime a liberdade de pensamento. Com seus programas de educação cruel em escolas e universidades. Eles perfuram nas crianças sua visão das coisas e qualquer tentativa de expressar uma opinião diferente é negada e punida.
  • Nossos filhos crescem, educados neste antigo e ainda inalterado Sistema. Um sistema que não tolera liberdade de pensamento e exige obediência estrita às regras.
  • Em que mundo diferente poderíamos viver se as pessoas estivessem dando saltos e não arrepios.
  • É tão difícil viver neste mundo, Cyberpunk.
  • É como se o tempo tivesse parado.
  • Vivemos no lugar certo, mas não na hora certa.
  • Tudo é tão comum. As pessoas são todas iguais, seus atos também. É como se a sociedade sentisse que é imperativo viver no passado.
  • Aqueles que tentam encontrar seu próprio mundo, o mundo do Cyberpunk, constroem um novo mundo. Construído em seus pensamentos, ele muda a realidade. Ele se estabelece sobre o mundo atual e, portanto, eles vivem em um mundo virtual. Espaço de pensamento, construído sobre a realidade.
  • Outros simplesmente se acostumam com o mundo como ele é. Eles continuam a viver nele, embora não gostem. Eles não têm outra escolha a não ser ter a esperança de que o mundo saia de sua rotina e siga em frente.
  • Estamos trabalhando para mudar a situação. Estamos trabalhando para ajustar o mundo presente às nossas necessidades e pontos de vista, para usar ao máximo o que é adequado e ignorar o lixo. Onde não podemos, apenas vivemos neste mundo, como Cyberpunks, não importa o quão difícil. Quando a sociedade luta contra nós, nós lutamos de volta.
  • Construímos nossos mundos no ciberespaço.
  • Entre os zeros e uns, entre os bits de informação.
  • Construímos nossa comunidade. A comunidade de Cyberpunks.

Editado por Isaac L. Wheeler (Veritas) e Christian A. Kirtchev. Tradução de autoria própria, Love4tek

O manifesto original pode ser encontrado no site: http://project.cyberpunk.ru/idb/cyberpunk_manifesto.html

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